As cores do tempo da graça
Luiz Carlos Ramos
A pregação do Evangelho é tanto mais eficaz quanto melhor for a comunicação da Igreja. Comunicação é mais do que discurso, pois se dá no nível verbal e no nível não-verbal. A Igreja evangeliza não somente pelo que ela fala, mas também (ou principalmente) pelo que ela demonstra. Dizem os estudiosos que mais de dois terços da área cerebral humana é destinada ao processamento de informações visuais. Assim, cada vez mais, fica evidente a importância da comunicação visual. E a combinação das cores é um importante elemento no estímulo à percepção visual humana.
Assim como as parábolas foram utilizadas por Jesus como recurso comunicativo para estimular a imaginação (imagem+ação) de seus discípulos, a Igreja emprega recursos visuais, principalmente na ambientação de seus espaços cúlticos, visando ao anúncio da Tempo da Graça. E foi com a experiência acumulada ao longo da história da Igreja, que o emprego das cores nos lugares de culto deixou de ser feito de maneira aleatória, para ser usada com critérios estéticos e teológicos.
Secularmente, o estudo das cores passou a ser feito mais sistematicamente no período do Renascimento, por Leon Batista Alberti que relacionou as cores com os quatro elementos da natureza: vermelho—fogo, azul—ar, verde—água, cinza—terra; e por Leonardo Da Vinci, que propôs a seguinte simbologia cromática: branco—luz, amarelo—terra, verde—água, azul—ar, vermelho—fogo e preto—trevas.
Desde então, confirmou-se, cientificamente, que as cores afetam o metabolismo humano basicamente da seguinte maneira: as cores quentes (vermelho, amarelo) aceleram o batimento cardíaco e aumentam a pressão arterial; ao passo que as cores frias (azul, verde) acalmam e relaxam.
Geometricamente, as cores são assim representadas: Quadrado—vermelho (que sugere ação centrífuga, i.e., do centro para fora), círculo—azul (que sugere ação centrípeta, i.e., de fora para o centro) e triângulo—verde (que sugere estabilidade).
Com estas informações, fica mais fácil entender por que a Igreja convencionou o uso do vermelho para o período de Pentecostes, pois é uma época de missão (de dentro para fora); e o uso do verde para o Tempo Comum, sugerindo a estabilidade e a persistência dos fiéis no cotidiano.
Vejamos, brevemente, o esquema tradicional das cores litúrgicas:
- Branco e a cor de ouro: simbolizam a Divindade, luz, glória, alegria e vitória. São usadas para celebrar a obra redentora de Cristo (Natal, Epifania, Batismo do Senhor, Transfiguração do Senhor, Páscoa, Ascensão do Senhor, Trindade e Cristo, o Rei do Universo);
- Vermelho: símbolo do fogo e do sangue dos mártires, é a cor das celebrações do Espírito Santo e da Igreja: Pentecostes, Dia da Reforma, aniversário de igrejas locais, ordenação e investidura de pastores;
- Roxo ou lilás ou violeta: caracterizam as épocas do ano cristão dedicadas à reflexão, arrependimento e preparação, como o Advento e a Quaresma. (Note que o roxo é a mistura de uma cor quente – o vermelho – e uma cor fria – o azul – , isso é representativo da tensão própria dos períodos de expectativa: o já e o ainda não).
- Azul claro: expressa esperança. Alguns teólogos (Barth, Tilich e von Almen) sugerem o azul como sendo a cor ideal para o templo, lugar para onde os fiéis convergem, por simbolizar a ação centrípeta da própria comunhão. Sugerem também que o círculo é a forma arquitetônica ideal para a disposição dos fiéis no templo (com a mesa da comunhão ao centro).
- Verde: é a cor da natureza, da vida e do crescimento e é usado ao longo do Tempo Comum (ou da Criação) por ser uma cor que denota estabilidade e constância.
- Preto: denota a morte e o luto e é usado na Quarta-Feira de Cinzas e na Sexta-Feira da Paixão.
Obviamente, esta é uma convenção basicamente ocidental. Em outras culturas, as cores podem assumir outros significados, ou até mesmos significados opostos. De qualquer forma, se conseguirmos utilizar o poderoso poder de comunicação visual das cores de forma inteligente e teologicamente coerente, estaremos melhorando nossa capacidade de pregar o Evangelho em uma sociedade marcada pelo fascínio das imagens.
25 de Janeiro de 2000
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